Aí ... mas de que serve imaginar
Regiões onde o sonho é verdadeiro
Ou terras para o ser atormentar ?
É elevar demais a aspiração,
E, falhado esse sonho derradeiro,
Encontrar mais vazio o coração.
Fernando Pessoa, in Soneto XXXIV
Há sempre um pedaço de morte
em cada segundo que passa
Muitas vezes a morte para certos
profissionais de saúde é uma rotina, para outros, é uma luta constante, para
alguns é uma aceitação dum caminho de vida em que a consciencialização os leva
ao raciocínio da aceitação, e da integração desta, como fazendo parte da vida,
desmistificando assim o horror que ela pode provocar
É neste final da vida que a saúde
falta, mas em que se espera que o espelho do tempo transforme momentos e
recordações em bocados de vida que alimentarão para sempre a saudade e a força
dos que ficam e proporcione a luz e confiança aos que partem.
O que acontece muitas vezes é que
os enfermeiros ou auxiliares da acção médica não escolheram os serviços onde
estão a executar funções e ao serem colocados em certos postos de trabalho
deparam com serviços onde a morte é uma realidade quotidiana e então cada qual
age segundo os seus mecanismos de defesa, segundo a sua formação e também
segundo a sua consciencialização e sensibilidade.
Várias vezes constatei médicos e
enfermeiros numa luta contra a morte mesmo quando o paciente apresentava sinais
de morte eminente, e quando o único remédio era mesmo proporcionar a paz e o
amor necessários para que o doente morresse tranquilo e com dignidade. Apenas
acompanhar.
Lembro-me daquele paciente que estava nos últimos instantes, quando médico
prescreve um Rx dos pulmões.
Achei que era demasiado cruel deslocar o paciente no estado de fragilidade em que se encontrava e
perguntei ao médico porque iria ele fazer este exame se o doente estava a
morrer, a resposta foi:
- “Para, pelo menos saber do que morreu.”
Por volta da uma hora, íamos para
colocar o paciente na maca para o levar ao serviço de radiologia e nesse mesmo momento
o doente entregou á vida o seu último suspiro.
Por vezes esses actos até fazem
sentido na medida em que na luta se vão preparando os mais reticentes doentes e
familiares e mesmo os médicos e enfermeiros...
Algumas vezes o paciente é
apanhado de surpresa e não está preparado para esta viagem final, assim como os
familiares e deste modo a luta preparara a morte do moribundo e o luto da
família e até dos que cuidam.
E aqui faz sentido a frase: “fizemos tudo para o salvar”
Esta fase tem dois sentidos o real e o aparente.
Para os profissionais de saúde o acompanhar o morrer é
Muito menos aceite em certas circunstância que o lutar por conservar a
vida, é uma questão de preparação
Por vezes invertemos os objectivos, esquecem-nos de que ao querermos
fazer viver o doente vamos dar-lhe mais alguns dias de vida mas sem nenhuma
qualidade.
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