Aí ... mas de que serve imaginar Regiões onde o sonho é verdadeiro Ou terras para o ser atormentar ? É elevar demais a aspiração, E, falhado esse sonho derradeiro, Encontrar mais vazio o coração. Fernando Pessoa, in Soneto XXXIV



Dedicado e assinado para ti...

De repente, falta-me a tinta e as palavras.
O sentir não sabe escrever.
 Age.
Abro páginas e páginas... Escreveram tanto?
Escrevi tanto,
Vivi tanto...
Senti tanto...
Amei muito...Amo e Amarei.
Sempre e para Sempre

Nada reteve. Apenas assinei.
Nada disse: Falou o coração.
Poupei silêncios e juntei ilusões

Resmas de dúvidas... Agora verdades, “sins” e “nãos”.
Tudo verdade.
Neste carrossel da vida.
Espalharam-nas sim. Tentei apanhá-las, sabes?


Voaram minhas... As palavras na ilusão dum castelo iluminado.
Descalcei as luvas, peguei em mim e olhei-me bem nos olhos.

Vi o reflexo do, tal qual eras foste e serás.
O Segredo pousou de galho em galho.
Não desistas, dizia ela. Tinha razão

E nesta profissão neste ramo vamos dando conta e cada vez mais do pouco que somos e do nada que temos mas o muito que somos capazes de dar.

SER HUMANO SENDO HUMANO
Nos nossos cuidados, tarefa hábil e frágil que é o cuidar do ser humano e neste caso na fase mais delicada da vida
Aquela em que as folhas de Outono caiem
Aquela em que os ramos secos de flores se tornam mais visíveis,
Aquelas em que as fotografias passam do álbum para  a memória aquela em que os filmes são reais
E...
Partilhar sempre o que temos de melhor no pior que pensamos ser.
O tempo vai passando e para a enfermeira Utilia também passaram anos e anos, silêncios, histórias e recordações que ela vai soltando e deixando voar para o infinito.
Tão jovem e projectada num serviço de doentes de SIDA ultima estado...Recordações vivas

...Vem-lhe outra vez à memória aquela pergunta que  fez ao João. Mas porquê que gostas de homens?

E elae ergunta
Utilia porque é que tu gostas de homens e os homens gostam de ti? A razão é a mesma.

Resposta que deu para eu compreender que o amor é simples aparece como por milagre tem como objecto a pessoa amada seja ela quem for. O coração escolhe.

Mas no meio disto tudo há a dor daqueles que não aceitam que o amor é por esta ou por aquela pessoa  e por vezes que duas pessoas do mesmo sexo se amam.
Algumas vezes o pai não aceita a homo sexualidade do filho ou da filha.
E vê-se então o sofrimento dos dois.

Tantas vezes vi o doente numa luta consigo próprio porque tinha que escolher o amor do  pai ou do amigo.
Mesmo nos últimos instantes...


Já pensaram que até mesmo a dor partilhada se torna mais leve?
Isto é como tudo... Pois claro.
Suponhamos, bem... Imaginamos um ramo de flores que partilho, ele desfaz-se e talvez calhe uma rosa, uma Margarida, uma violeta, um lírio a cada um (uma) daqueles que querem bem recebê-las.
Assim também é a dor ao partilhá-la ela dilui-se e torna-se muito mais leve.
Simplesmente as flores partilhadas consolam as pessoas que as recebem, mas a dor Partilhada?
Essa se não se dá com amor e se recebe com muito mais amor acaba por se multiplicar e proliferar.

Debruasse-se sobre a dor, e com os olhos postos naquele corpo que se vai desistindo dele mesmo, onde já nem os gemidos se ouvem perscrute agora os sinais sofredores, sinais de vida.
E de um doente ao outro a enfermeira vê, ouve sente e vai cuidando segundo as necessidades.

Aquela testa franzida...
Aquela amargura bebida em pequenas goladas,
Num respirar de peixinho fora da água.
E aquela sensação de incompreensível...

“A minha dor? “A tua dor?

Nada fácil e muitas vezes  eu não conseguia distinguir muito bem o sofrimento que sentia ao ver os doentes sofrer.

Sempre muito mais de proximidade com o paciente.
Como o pão duro e negro que se esmigalha ao cair assim, nós acompanhamos estes últimos instantes

Calmos (as) e serenos (os) pois só podemos dar aquilo que temos.

Esqueço-me de que sou um ser humano(a) estou para cuidar não posso falhar estou para ajudar...

Algum acompanhante compreende o que é ser-se enfermeiro nestas circunstâncias?

É isso mesmo Ser Cuidador (Cuidar da dor)

E naqueles momentos de proximidade a enfermeira está e persiste em acompanhar até ao fim.

Baixo os meus olhos sobre as tuas mãos finas um pouco pálidas e frias, pego nelas...
Tento aquecer no peito o que essas mãos geladas me transmitem
Coloco palavras e sentimentos naquelas mãos...
Ternura
Abandono
Impotência
Desisto

Tenho uma sensação de paz diz...
Sinto-me alguém que fechou o cortinado no último acto do filme da sua vida

Estou em Paz
Obrigada


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